“Superpopulação” é
uma ficção atuarial: um codinome para a aparição de um número de pessoas que,
em vez de ajudarem a economia a funcionar com tranquilidade, tornam muito mais
difícil a obtenção (...) dos índices pelos quais se mede e avalia o
funcionamento adequado. A quantidade desses indivíduos parece crescer de
maneira incontrolável, aumentando continuamente as despesas, mas não os ganhos.
(...) Numa sociedade de consumidores, elas são os “consumidores falhos” –
pessoas carentes do dinheiro que lhes permitiria ampliar a capacidade do
mercado consumidor, e que criam um novo tipo de demanda a que a indústria de
consumo, orientada para o lucro, não pode responder nem “colonizar” de maneira
lucrativa. Os consumidores são os principais ativos da sociedade de consumo,
enquanto os consumidores falhos são os seus passivos mais irritantes e
custosos.
A “população excedente”
é mais uma variedade de refugo humano. Ao contrário dos homini sacri,
das “vidas indignas de serem vividas”, das vítimas dos projetos de construção
da ordem, seus membros não são “alvos legítimos” excluídos da proteção da lei
por ordem do soberano. São, em vez disso, “baixas colaterais”, não intencionais
e não planejadas, do progresso econômico.
(Zygmunt
Bauman, Vidas desperdiçadas, Rio de
Janeiro, 2005).