segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Ciência e Filosofia

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Jaspers fixa os limites do saber científico. Esses limites podem ser brevemente caracterizados do seguinte modo:
a)      O conhecimento científico das coisas não é conhecimento do ser
O conhecimento científico se refere a objetos determinados: ele “não saber o que é o próprio ser”.
b)      “O conhecimento científico não está em condições de dar nenhuma orientação para a vida. Ele não estabelece valores válidos. A ciência não pode guiar a vida; por sua clareza e decisão, ela remete a outro fundamento da nossa vida”.
c)      “A ciência não pode dar nenhuma resposta à pergunta relativa ao seu verdadeiro sentido: o fato de que a ciência existe baseia-se em impulsos que não podem ser, sequer eles, demonstrados cientificamente como verdadeiros e como devendo existir”.

Nenhum ser conhecido é o ser

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Além do intelecto (isto é, a ciência), existe a razão. E é exatamente à razão que Jaspers confia aquela iluminação-da-existência em que consiste a filosofia. Escreve Jaspers: “Existe um pensar no qual não é conhecido nada que tenha validade universal e force a sentimento, mas que pode revelar conteúdos que servem de sustentação e norma para a vida. Esse pensar penetra e abre caminho, iluminando e não mais conhecendo... Nesse caso, o pensamento não me propicia conhecimentos de coisas até então estranhas para mim, mas me torna claro o que eu verdadeiramente entendo, o que eu creio. Nesse caso, o pensamento cria e determina para mim o fundo claro de minha auto-consciência”.
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A exatidão  pura e simples não nos satisfaz. A verdade é algo infinitamente mais do que a exatidão científica. O homem pode ser estudado (através da biologia, psicologia, etc.) como um objeto do mundo. Mas nesse estudo, diz Jaspers, deixa e sempre deixará fora de si a existência. Em sua concretude, singularidade e irreptível excepcionalidade, a existência não pode ser objeto ou exemplar indiferente ou substituível de teorias ou discursos universais. A existência é sempre a minha existência, singular, inconfundível. Tanto para um como para o outro, “compreender a si mesmo (...) é o caminho para a verdade”.
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O homem é dado, não é um dado de fato: ele pode ser. Mas o que pode ser o homem? Sua escolha, afirma Jaspers, está no reconhecimento e na aceitação daquela possibilidade – na única possibilidade -  que é a situação em que o homem se encontra: “o meu eu é idêntico ao lugar da realidade em que me encontro”. A minha situação se identifica comigo mesmo, pois não posso ser senão o que sou e não posso me tornar senão o que sou: “eu estou em situação histórica se me identifico com uma realidade e com a sua tarefa imensa (...). Eu posso pertencer somente a um único povo, posso ter apenas estes genitores e não outros, posso amar somente a uma única mulher”. Claro, eu posso trair. As se eu traio, estou traindo a mim mesmo, já que eu sou a minha situação e essa é a realidade intranscindível. Eu só posso me tornar o que eu sou. E a única escolha autêntica está na consciência e na aceitação da situação em que se está. A liberdade não é o instrumento das alternativas, (...).

Reale, Giovanni & Antiseri, Dario. História da Filosofia. São Paulo: Paulinas, 1991, vol. III. 

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