(...)
Jaspers
fixa os limites do saber científico. Esses limites podem ser brevemente
caracterizados do seguinte modo:
a) O conhecimento científico
das coisas não é conhecimento do ser
O conhecimento científico se
refere a objetos determinados: ele “não saber o que é o próprio ser”.
b) “O conhecimento científico
não está em condições de dar nenhuma orientação para a vida. Ele não estabelece
valores válidos. A ciência não pode guiar a vida; por sua clareza e decisão,
ela remete a outro fundamento da nossa vida”.
c) “A ciência não pode dar
nenhuma resposta à pergunta relativa ao seu verdadeiro sentido: o fato de que a
ciência existe baseia-se em impulsos que não podem ser, sequer eles,
demonstrados cientificamente como verdadeiros e como devendo existir”.
Nenhum
ser conhecido é o ser
(...)
Além
do intelecto (isto é, a ciência),
existe a razão. E é exatamente à
razão que Jaspers confia aquela iluminação-da-existência
em que consiste a filosofia. Escreve Jaspers: “Existe um pensar no qual não
é conhecido nada que tenha validade universal e force a sentimento, mas que
pode revelar conteúdos que servem de sustentação e norma para a vida. Esse
pensar penetra e abre caminho, iluminando e não mais conhecendo... Nesse caso,
o pensamento não me propicia conhecimentos de coisas até então estranhas para
mim, mas me torna claro o que eu verdadeiramente entendo, o que eu creio. Nesse
caso, o pensamento cria e determina para mim o fundo claro de minha
auto-consciência”.
(...)
A
exatidão pura e simples não nos
satisfaz. A verdade é algo infinitamente mais do que a exatidão científica. O
homem pode ser estudado (através da biologia, psicologia, etc.) como um objeto
do mundo. Mas nesse estudo, diz Jaspers, deixa e sempre deixará fora de si a existência. Em sua concretude,
singularidade e irreptível excepcionalidade, a existência não pode ser objeto
ou exemplar indiferente ou substituível de teorias ou discursos universais. A
existência é sempre a minha existência,
singular, inconfundível. Tanto para um como para o outro, “compreender a si
mesmo (...) é o caminho para a verdade”.
(...)
O
homem é dado, não é um dado de fato: ele pode
ser. Mas o que pode ser o homem? Sua escolha, afirma Jaspers, está no
reconhecimento e na aceitação daquela possibilidade – na única possibilidade - que é
a situação em que o homem se encontra: “o meu eu é idêntico ao lugar da realidade em que me encontro”.
A minha situação se identifica comigo mesmo, pois não posso ser senão o que sou
e não posso me tornar senão o que sou: “eu estou em situação histórica se me
identifico com uma realidade e com a sua tarefa imensa (...). Eu posso
pertencer somente a um único povo, posso ter apenas estes genitores e não
outros, posso amar somente a uma única mulher”. Claro, eu posso trair. As se eu
traio, estou traindo a mim mesmo, já que eu sou a minha situação e essa é a
realidade intranscindível. Eu só posso me tornar o que eu sou. E a única
escolha autêntica está na consciência e na aceitação da situação em que se
está. A liberdade não é o instrumento das alternativas, (...).
Reale, Giovanni & Antiseri,
Dario. História da Filosofia. São Paulo: Paulinas, 1991, vol. III.
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