domingo, 21 de agosto de 2011

A Consciência Participante

A concepção da realidade que predominou no ocidente até as vésperas da Revolução Científica era de um "mundo encantado". As rochas, as árvores, os rios e as nuvens eram tidos pelo homem como seres maravilhosos e portadores de vida. Os homens, por sua vez, sentiam-se em casa neste "mundo encantado". O cosmo era o lar ao qual pertenciam. Cada pessoa não era um observados distante, alienado, mas um direto participante da trama da vida. O destino pessoal de cada um estava ligado ao destino do cosmo, e esta interrelação conferia sentido profundo à vida de todos. Esse tipo de concepção da realidade - que chamarei consciência participante - envolve a fusão ou identificação do homem com o seu ambiente natural, expressando uma integração psíquica que há muito tempo deixou de existir.
Considerando-se o plano mental, a história da Época Moderna é uma história de progressivo desencantamento. A partir do século XVI, a mentalidade científica nos tornou verdadeiros estrangeiros (seres não-integrados) em relação aos fenômenos do mundo. Inovações capazes de questionar essa visão da realidade - física quântica, ou certas pesquisas ecológicas - não foram suficientes para abalar a forma dominante do pensamento vigente. Essa forma pode ser adequadamente descrita com palavras coo desencantamento, não-integração, pois ela insiste em estabelecer uma rígida separação entre o observador e o observado. Assim, a consciência científica tornou-se uma consciência aliada no sentido de que não promove uma fusão harmoniosa com a Natureza, mas sim a separação plena dela. O sujeito conhecedor e o objeto investigado são encarados como pólos opostos, antagônicos. "Não sou minhas experiências e conclusões sobre o mundo. Portanto, não faço parte deste mundo" - raciocina o cientista. A conseqüência lógica dessa visão de mundo é um sentimento de coisificação: tudo é objeto, estranho, não-eu. E "eu", afinal, também sou um objeto; um ser à parte, em meio a tantos outros seres. O cosmo não foi construído por mim; tampouco se importa com minha existência e eu não tenho a sensação de estar nele integrado.
Durante mais de 99% da história da humanidade, vigorou a concepção de que o mundo era encantado e o homem se sentia como parte integrante dele. Nos últimos quatro séculos, a total reversão dessa concepção destruiu, no plano psíquico e físico, o sentimento de integração do homem em relação ao cosmo. Isso foi responsável pela quase-destruição ecológica do Planeta. A única esperança, parece-me, está no re-encantamento do mundo como meio de nosso re-encontro.
É nisso que reside a questão central do dilema moderno. Não podemos voltar à alquimia ou ao animismo - pelo menos isso não parece provável. Por outro lado, não podemos permanecer com este mundo triste, de frieza científica, controlado por computadores, ameaçados por reatores nucleares. É preciso desenvolvermos algum tipo de consciência holística ou participante - e uma formação sócio-política correspondente - se desejamos sobreviver enquanto espécie genuinamente humana.
Morris Berman

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